ESTAMOS DIANTE DE UMA EPIDEMIA DE TRANSTORNOS MENTAIS?

É POSSÍVEL EVITAR UMA EPIDEMIA DE TRANSTORNOS MENTAIS PÓS PANDEMIA?

“Tudo o que estamos vivenciando globalmente é de tamanha dimensão e complexidade que pode ter impactos significativos e devastadores na saúde mental da população. A boa notícia é que, em meio ao sofrimento compartilhado e um mar de incertezas, podemos lançar mão de estratégias e recursos que nos fortaleçam, alimentem a nossa esperança de dias melhores e nos ajude a passar por este período com crescimento e resiliência.”

Rosalina Moura

Passar por uma pandemia sem precedentes como a do Novo Coronavírus tem exposto a população mundial a níveis elevados de estresse por um tempo prolongado, o que gera impactos psíquicos significativos. Sabemos que reações comuns diante de uma situação ameaçadora e desconhecida podem evoluir para transtornos. Apesar disso, em uma epidemia as implicações psicológicas e psiquiátricas tendem a ser subestimadas. Como resultado o risco de adoecimento psicológico, como mostram pesquisas relacionadas às epidemias da Sars na China em 2002 e de Ebola na África em 2006, aumentam consideravelmente. E alguns dados podem servir de termômetro do momento. Por exemplo, em 2020 os brasileiros buscaram na internet três vezes mais pelo termo “ansiedade” do que na média dos últimos 16 anos. E a busca por “como é ter crise de ansiedade” saltou mais de 50 vezes.

OS EFEITOS DE UMA PANDEMIA E AS BUSCAS NA INTERNET

Segundo a OMS, uma falha em levar o bem-estar emocional das pessoas a sério agora implicará em altos custos sociais e econômicos a médio e longo prazos para a sociedade. A pandemia atual nos coloca diante do risco de uma segunda pandemia, a de Transtornos Mentais, com todas as suas consequências devastadoras para as pessoas e a sociedade.

COM O QUE ESTAMOS LIDANDO AGORA?

Fomos forçados a uma parada inesperada e indesejada, que trouxe grandes transformações no modo de viver, trabalhar e nos relacionarmos. E nos consultórios de psicologia (agora virtuais e a cada dia mais cheios) acolhemos as angústias e o sofrimento das pessoas e famílias que têm que lidar com muitos estressores como:

  • isolamento social
  • interrupção das rotinas das escolas e do contato com colegas e professores
  • confinamento de crianças e jovens
  • convívio com o medo constante
  • trabalho remoto forçado
  • exposição de quem precisa sair de casa para trabalhar
  • insegurança, incerteza e medos em relação ao futuro
  • sentimento de ameaça à saúde e à vida
  • desconhecimento sobre a doença e tratamentos
  • impossibilidade ou restrição de toque físico e abraços
  • morte de entes queridos
  • conflitos conjugais e familiares potencializados pelo confinamento

Subjacente a tudo isso vivemos muitas perdas:

  • perda da “liberdade”
  • da possibilidade de fazer escolhas
  • da sensação de segurança e previsibilidade
  • das risadas e encontros com os amigos
  • dos passeios de final de semana
  • dos rituais de despedida de pessoas queridas
  • do encontro real com o outro
  • dos planos para o futuro
  • das festas comemorativas em família
  • de poder aquisitivo, entre tantas outras

Estamos vivendo um luto coletivo, que precisa ser reconhecido e elaborado. No contexto atual tudo o que foi exposto pode ser vivenciado de forma traumática. Embora o mundo seja essencialmente dinâmico onde as mudanças fazem parte da vida e da nossa existência, a pandemia chegou sem aviso prévio, forçou mudanças de forma antinatural e apressou a necessidade de mudanças, desafiando a nossa capacidade de adaptação.

Diante do exposto podemos afirmar que estamos experienciando estresse elevado e excessivo por um tempo prolongado, o que agrava os seus impactos.

QUAIS SÃO OS SINAIS DO ESTRESSE EXCESSIVO?

Sob estresse o nosso corpo libera hormônios em alta dosagem como adrenalina e cortisol, a pressão arterial aumenta, os músculos se contraem, a frequência cardíaca se eleva. Na fase aguda estas reações nos ajudam a lidar melhor com as situações, mas quando prolongadas geram efeitos muito nocivos. A ativação do sistema nervoso simpático pode se manter por muito tempo, aumentando a vulnerabilidade a doenças físicas e psíquicas. E um dos impactos do estresse crônico é a queda da imunidade.

Uma das formas de saber se o stress está atingindo patamares elevados é por meio da identificação dos seus sintomas e sinais. Abaixo os principais e que têm sido comuns:

  • irritabilidade excessiva
  • sensação de alerta e tensão constante
  • cansaço e falta de ar
  • distúrbios de sono
  • pensamentos recorrentes em torno do mesmo assunto
  • baixa imunidade e adoecimento frequente
  • dificuldades para criar e ter ideias novas
  • diminuição ou perda do apetite sexual
  • perda de interesse e baixa motivação
  • dificuldades para manter a concentração e a atenção
  • problemas de memória
  • problemas de pele e gastrointestinais
  • dores e tensão muscular

COMO ESTÁ NOSSA SAÚDE MENTAL? DADOS DE UM LEVANTAMENTO

Uma pesquisa online realizada pela consultoria Rumo Saudável com 183 pessoas residentes no Brasil (142 mulheres e 41 homens, a maioria entre 25 e 54 anos) em maio de 2020 revelou que:

  • 54% apresenta sintomas de estresse excessivo. Quando separamos por sexo temos 62% das mulheres com sintomas de estresse excessivo contra 45% dos homens.
  • 32% apresenta sinais de Depressão
  • 25% apresenta sinais de Transtorno de Ansiedade

Em relação aos hábitos de vida neste período:

  • 57% das pessoas referem estar com uma carga de trabalho maior do que antes da pandemia
  • 48% percebe que está realizando menos no trabalho em função de questões emocionais ou estresse
  • 56% refere não conseguir gerenciar bem o tempo e equilibrar as necessidades do trabalho e da vida pessoal e familiar
  • 90% referiu não praticar qualquer técnica de relaxamento ou meditação
  • 15% já estava está fazendo acompanhamento psicológico
  • 30% refere estar sentindo necessidade de buscar atendimento profissional
  • 9% das pessoas referem ter pensado que seria melhor acabar com a sua vida (em pesquisas realizadas pela Rumo antes da pandemia, esse índice variava de 3 e 5%).

É muito provável que você tenha se identificado com estes resultados. Como minimizar os impactos negativos desta fase que deixará marcas profundas e transformará a todos?

DÁ PARA FAZER UMA LIMONADA?

Crises sempre contém oportunidades de aprendizado e crescimento. Portanto, mesmo que não possamos mudar a realidade, existe algo que está ao nosso alcance: mudar a forma de encarar e enxergar as situações. Para isto, algumas perguntas reflexivas podem facilitar este processo:

  • Como estou encarando e vivendo tudo isso?
  • O que posso fazer diferente para lidar melhor com as mudanças?
  • Existe algo que ainda não experimentei que pode me fazer sofrer menos?
  • O que preciso mudar em mim?
  • O que recarrega a minha bateria e me dá energia?
  • O que pode alimentar a esperança de dias melhores?

Concluindo, cuidar de si mesmo física e emocionalmente é crucial para enfrentar os desafios, evitar o estresse tóxico e passar por esta fase com resiliência. Para isto, existem algumas coisas que você pode fazer para te ajudar. Veja a seguir.

10 atitudes para reduzir os níveis de estresse e proteger a sua saúde mental

1- ACEITAR o que não pode ser mudado – como a pandemia, as mudanças na rotina, as restrições.

A aceitação diminui a ansiedade e o sofrimento e nos ajuda a focar nas ações que estão ao nosso alcance.

2- Descobrir FORMAS NOVAS E CRIATIVAS para lidar com as situações e os problemas em um novo contexto. Valorize o PRESENTE.

“Sempre foi assim” precisa deixar de existir e abrir espaço para “como pode ser agora, diferente?”


3- Investir no desenvolvimento da INTELIGÊNCIA EMOCIONAL

Invista no autoconhecimento e consciência de seus sentimentos, pensamentos e reações

4- Manter RELACIONAMENTOS e buscar o apoio de pessoas, mesmo à distância


Relacionamentos são mediadores do estresse e contribuem para que nosso corpo libere substâncias protetivas da nossa saúde física e mental
5- Incluir MEDITAÇÃO e práticas de relaxamento no seu dia – vale fazer algumas respirações conscientes, sentindo o ar entrando e saindo de você.
Vários estudos científicos comprovam a sua eficácia e os inúmeros benefícios para o alívio do estresse, melhora da saúde mental e física.

6- Ter uma ROTINA que inclua alimentação nutritiva, a prática de alguma atividade física e um bom sono (com horário para dormir e acordar).
Estes 3 elementos são fundamentais para aumentar a imunidade e proteger nosso corpo e mente dos efeitos negativos do estresse
7- Realizar ATIVIDADES RELAXANTES como desenho, artes manuais, cuidar de plantas, tocar um instrumento…
Nosso corpo libera substâncias como a dopamina, serotonina e ocitocina, que aumentam a sensação de bem-estar.

8- Tenha um DIÁRIO e pratique GRATIDÃO– pode ser um app, bloco de notas ou um caderno velho. Registre pensamentos, sentimentos e gratidão.
A parada para o registro diário ajuda a enxergar as coisas por outras perspectivas, amplia a visão e as possibilidades.
9- Pratique a AUTOCOMPAIXÃO, especialmente diante dos desafios complexos, dificuldades ou sofrimento.
Seja gentil com você mesmo como seria com uma pessoa muito querida. Se pergunte: “o que eu preciso agora?”.

10- Todos nós precisamos de AJUDA na vida. Não deixe de procurar um psicólogo, psicóloga ou psiquiatra se sentir necessidade.
Procure um profissional em quem confie ou tenha referências. Neste momento a maioria atende online, formato utilizado há bastante tempo e efetivo.

A psicóloga Rosalina Moura é especialista em Gerenciamento do Stress e em Terapia Familiar e de Casais pela PUC-SP. Foi coordenadora da área de psicologia do Instituto de Ortopedia do Hospital das Clínicas de São Paulo de 1994 a 2005. É diretora da Rumo Saudável, consultoria para empresas em Saúde Mental e Gestão do Estresse.  

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